Nuvens: um breve entendimento – II
Dando prosseguimento a nossa postagem anterior. O que nos motivou a escrever estas postagens sobre nuvens, em particular as CB’s, foi o terrível acidente aéreo com o vôo Air France AF 447, Rio de Janeiro – Paris, que caiu no mar entre o continente sul-americano e o continente africano. Ao que parece há uma estreita relação entre dificuldades técnicas que motivaram a queda deste avião e as características climáticas apresentadas naquela região. Tais características tem a ver principalmente com o fato desta região também ser a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), basicamente uma área de encontro de massas de ar advindas dos hemisférios norte e sul, exatamente na Linha do Equador, e que tem por característica apresentar uma forte nebulosidade. Disto decorre por sua vez a forte presença de formações de nuvens responsáveis por condições meteorológicas extremamente adversas, como é o caso, em particular das nuvens Cumulus Nimbus (CB).
Segundo o texto “Tipos de Nuvens e sua relação com o Quadro Sinótico”, de autoria do Departamento de Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP), com base no Manual de Meteorologia do Ministério da Aeronáutica, as nuvens cumulus nimbus (CB) apresentam as seguintes características:
Nuvem densa e possante de grande dimensão vertical, em forma de montanha ou de enormes torres; as dimensões horizontais e verticais são tão grandes que a forma característica da nuvem só pode ser vista a longa distância;
Uma parte da região superior e geralmente lisa, fibrosa ou estriada e quase sempre achatada; esta parte pode se desenvolver em forma de bigorna ou vasto penacho;
Constituídos por gotículas de água em suas partes inferiores e por cristais de gelo nas superiores; pode conter grandes gotas de chuva e granizo;
Seu aspecto é sombrio e ameaçador, habitualmente sendo acompanhado por trovões, relâmpagos e fortes pancadas de chuva;
Sua formação está associada a cumulus bastante volumosos e desenvolvidos, sendo portanto análoga à de cumulus;
Após a fase de cumulus congestus, ocorre o cumulonimbus calvus, quando existe um limite claro da nuvem (sem fibras ou franjas ou formações do tipo bigorna); daí para a fase madura (cumulonimbus capillatus) o desenvolvimento é bastante rápido;
A fase calvus implica no início de fortes pancadas, culminando no estágio capillatus;
Pode se desenvolver de um altocumulus ou de um altostratus cujas partes superiores apresentam protuberâncias (nesse caso, sua base está bem elevada);
A existência de cumulonimbus implica, praticamente sempre, em intensa precipitação, forte turbulência, presença de rajadas e avanço de linhas de instabilidade;
Podem conter granizo, que é um dos hidrometeoros mais destrutivos e também ocasionar tornados.
Assim, diante do disposto acima, as Cumulus Nimbus (CB) possivelmente se apresentaram ao vôo AF 447 na noite do acidente com as suas características peculiares, que são:
“Nuvem de trovoada; base entre 700 e 1.500 m, com topos chegando a 24 e 35 km de altura, sendo a média entre 9 e 12 km; são formadas por gotas d'água, cristais de gelo, gotas superesfriadas, flocos de neve e granizo. Caracterizadas pela "bigorna": o topo apresenta expansão horizontal devido aos ventos superiores, lembrando a forma de uma bigorna de ferreiro, e é formado por cristais de gelo, sendo nuvens do tipo Cirrostratos (CS).” Fonte: INMET – Atlas de Nuvens.
Já Varejão-Silva define uma nuvem Cumulus Nimbus (CB) como sendo,
“Nuvem volumosa, muito densa, de grande desenvolvimento vertical, com a forma de montanha, encimada ou não por uma imensa bigorna ou penacho, cujas extremidades são cirrosas. Embora a base destas nuvens esteja bastante próxima da superfície terrestre, seu topo pode alcançar níveis muito elevados. Por isso mesmo as cumulonimbos só são inteiramente observados quando se encontram a considerável distância. Estas nuvens costumam produzir aguaceiros violentos, acompanhados de relâmpagos e trovões. Algumas vezes produzem granizo ou saraiva. Nas porções inferiores são formadas por gotículas de água e de chuva. Nas porções superiores são encontradas gotículas de gelo, neve e pelotas de gelo. Quase sempre se originam do desenvolvimento de cumulus. Ora se apresentam isoladas, ora formando fileiras semelhantes a muralhas.” Fonte: Varejão-Silva (2005, p. 376).
Vale lembrar ainda que naquela região do globo a alta incidência de nebulosidade deve-se principalmente a alta evaporação da água do oceano, por conta da maior incidência de raios solares. Por isso se dizer que o clima nesta faixa do globo é um clima equatorial, caracterizado principalmente por altos índices de pluviosidade. Aliado a isso tem o impacto gerado por nuvens com características distintas em permanente contato. Este é o ambiente climático naquela faixa do Globo e que tão bem caracteriza a Zona de Convergência Intertropical, de acordo com o conceito apresentado pela Fundação Cearense de Meteorologia:
“A ZCIT é uma banda de nuvens que circunda a faixa equatorial do globo terrestre, formada principalmente pela confluência dos ventos alísios do hemisfério norte com os ventos alísios do hemisfério sul. De maneira simplista, pode-se dizer, que a convergência dos ventos faz com que o ar, quente e úmido ascenda, carregando umidade do oceano para os altos níveis da atmosfera ocorrendo a formação das nuvens. A ZCIT é mais significativa sobre os Oceanos e por isso, a Temperatura da Superfície do Mar-TSM é um dos fatores determinantes na sua posição e intensidade.” Fonte: FUNCEME.
Segundo informações o avião voava a 11.000 metros. Nesta área ele encontrou condições extremamente adversas, inclusive com a presença de granizo. Uma das hipóteses da provável causa do acidente foi a falha de interpretação de dados por conta dos computadores de bordo, transmitindo comandos conflitantes ao avião. Aliado às condições meteorológicas apresentadas no momento do acidente, dada a natureza da região, o avião possivelmente se desintegrou ainda no ar, o que pode ser constatado pela distância apresentada pelos poucos destroços apresentados até o momento.
Texto original em
Rascunho Geo ©