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HAGHPAT e
SANAHIN
Despeço-me da Geórgia nesta manhã de sábado, deixando para uma próxima visita a região de Kakheti, no extremo oriental o país, e principalmente a região de Svaneti no Noroeste do país. A Geórgia é grande demais para ser vista numa semana e havia que fazer escolhas.
Para viajar para Yerevan, capital da Arménia, aproveito a excursão do Hostel Envoy, que une as duas capitais, com várias paragens no caminho. O preço é relativamente alto (29 900 AMD, 56€), mesmo incluindo almoço na casa de um particular e lanche numa padaria já perto de Yerevan. A viagem começa às 9h e termina 12 horas depois na capital da Arménia.
Por volta das 10 e meia chegamos à fronteira da Geórgia (a foto proibida possível).
Há um grande grupo à nossa frente e apenas dois postos abertos; temos que esperar cerca de meia hora para todos voltarmos a entrar no minibus. Na fronteira da Arménia outra meia hora; apesar de haver mais postos abertos, o outro grupo deveria ter estado anteriormente no Azerbaijão e cada pessoa foi sujeita a um longo interrogatório. Ao meio-dia entramos oficialmente na Arménia.
ARMÉNIA
A Arménia é o mais pequeno dos três países do Cáucaso. Sem qualquer acesso ao mar, tem no lago Sevan, a 1900m de altitude, a sua maior massa de água, sendo esta a principal estância balnear do país. Quase todo o território situa-se a elevada altitude, sendo atravessado pelas montanhas do Baixo Cáucaso.
Foi o primeiro país a adoptar o Cristianismo, no ano 301 e tem a sua própria Igreja. Quase todos os locais turísticos do país são de índole religiosa (Igrejas, Mosteiros), localizados em locais fabulosos do ponto de vista natural. As Igrejas arménias contrastam com a ostentação e o dourado da Igreja Ortodoxa Russa. São escuras, com aberturas no topo para os raios do Sol entrarem (de manhã iluminam a Bíblia que se localiza no altar, razão pela qual os altares se situam sempre na fachada Oriental das igrejas). Outra atracção religiosa, Património Imaterial da Humanidade, são os Khachkar, um estilo de pedras tumulares ornamentadas, que existem em grande quantidade por todo o país.
A História da Arménia é similar com a da Geórgia até ao início do século XX. OS arménios ocupavam grande parte desta região, desde o mar Cáspio à Anatólia Central, mas raramente constituíram um país independente, estado sempre sob domínio, de forma alternada, de otomanos, persas, romanos e russos.
O período mais negro da História da Arménia ocorreu no início do século XX. Durante a I Guerra Mundial, um dos principais pontos de conflito ocorria entre o Império Otomano, liderado pelos “jovens turcos” e a Rússia czarista. O território que constitui a Arménia Ocidental, hoje ocupado pela Turquia, assistiu a violentos combates. Vários arménios estavam alistados no exército otomano, mas em Istanbul havia cada vez mais suspeitas de que os arménios na sua maioria estavam do lado dos russos. Não se sabe se tal corresponde à verdade ou se fazia parte da propaganda otomana como desculpa para exterminar os arménios, tal como aconteceria anos depois com os judeus na Alemanha pré WWII.
A 24 de abril de 1915 é dada ordem para o início daquele que hoje se define como Genocídio Arménio, iniciando-se com a detenção e posterior assassinato da elite intelectual arménia de Istanbul. Ainda houve vários focos de resistência, principalmente na cidade de Van, onde a população arménia resistiu vários dias de forma estoica, mas rapidamente os arménios foram esmagados, mortos alguns, deportados outros nas marchas para a morte, em condições desumanas até ao deserto sírio. Na cidade síria de Deir es Zor, para onde uma grande quantidade de arménios foi encaminhada e posteriormente morta em campos de concentração existiu até há dois anos atrás um memorial em homenagem a todas as vítimas do Genocídio. Há dois anos atrás o Estado Islâmico destruiu-o.
Os arménios do Oriente pareciam estar a salvo. Estando em território ocupado pela Rússia, tinham a sua protecção e sabendo o que se passava na Arménia Ocidental os arménios mobilizavam-se para apoiar os russos. Mas após a revolução de outubro a Rússia abandona as suas posições e os otomanos avançam para Oriente. O avanço dos otomanos era rápido e parecia que rapidamente toda a Arménia seria esmagada mas uma milagrosa vitória em Sardarapat, às portas de Yerevan, permite à Arménia manter o pequeno território que ainda hoje lhe resta. O exército arménio estava em menor número, menos apetrechado e desmoralizado mas venceu em Sardarapat. Se não fosse esta vitória era muito provável que hoje a Arménia não existisse.
Um dos vários arménios na diáspora que conheci na viagem a Nagorno Karabagh tem uma teoria sobre esta e outras vitórias militares milagrosas dos arménios. “Os outros lutam por terras, minérios, espalhar a religião, mas nós lutamos pela nossa vida. Sabemos que se perdermos somos exterminados”.
Pouco depois de Saradarapat a I Guerra Mundial termina com a derrota dos otomanos e a Arménia declara independência. Tal como aconteceu com a Geórgia, esta apenas dura 3 anos, sendo a Arménia integrada como República Soviética em 1921. Nessa altura, como agradecimento de Estaline ao Azerbaijão por este se ter integrado voluntariamente na URSS (a Arménia foi integrada à força) os territórios de Naquichevão e de Nagorno Karabagh são integrados na República Soviética do Azerbaijão, o que mais tarde originaria o conflito de Nagorno Karabagh.
Hoje a Arménia vive uma guerra sem fim contra o Azerbaijão, país que devido aos combustíveis fósseis está-se tornando cada vez mais rico, com gastos milionários na Defesa. A Arménia é um país relativamente pobre, a sua maior riqueza provém da diáspora que se espalhou pelo Mundo durante o Genocídio, e que para além do investimento que fazem no país de origem conseguem ser em quantidade suficiente para influenciar a política de alguns países como a França e os EUA. Mas a balança pende claramente para o Azerbaijão, e a guerra parece inevitável. Há muito ódio de ambas as partes e a radicalização islâmica que também tem ocorrido no Azerbaijão a reboque do que se passa no país irmão (Turquia) e do surgimento do Estado Islâmico (a cidade recém libertada de Mossul fica a menos de 400 km da fronteira arménia) fazem temer o pior.
O custo de vida na Arménia é ligeiramente inferior ao da Geórgia. Nota-se alguma pobreza nas zonas rurais mais afastadas de Yerevan. A ruralidade fora de Yerevan é ainda mais vincada que nas zonas mais recônditas da Geórgia.
Entramos na Arménia pela província de Lori, que outrora prosperou com a exploração mineira. Hoje está em decadência, e é de todas as regiões da Arménia onde estive a que me pareceu mais pobre.
A primeira paragem, ainda bem perto da Geórgia é na Fortaleza/Mosteiro de Akhtala. Para além da catedral de Echmiadzin, a sede da Igreja Arménia, esta foi a única igreja que visitei que fugia aos tons escuros, uma vez que durante vários anos pertenceu à Geórgia e foi usada pelos Ortodoxos Russos:
Após Akhtala, visitamos o Mosteiro de Haghpat, Património Mundial da UNESCO. Actualmente decorrem obras de requalificação financiadas pela Fundação Calouste Gulbenkian, também ele descendente de arménios.
Haghpat significa “vitória” em arménio. Conta a história que um aluno apostou com o seu mestre que conseguiria fazer um mosteiro mais bonito que o que ele havia feito (Mosteiro de Sanahin, localizado na encosta em frente, iríamos visitar após o almoço). Depois de vários anos a trabalhar neste mosteiro, o mestre reconhece que o aluno o ultrapassara, batizando o mosteiro como Haghpat. Em contrapartida, o aluno reconhece que o do mestre é mais antigo, denominando-o de Sanahin, “mais antigo”.
Khachkares:
Estes dois mosteiros localizam-se no desfiladeiro do rio Debed:
Fomos almoçar, a casa de uma senhora perto de Haghpat e, após uma valente trovoada com granizo do tamanho de berlindes, descemos para Alaverdi, a principal cidade da região e espelho da sua decadência:
Já com o Sol a querer reaparecer chegamos a Sanahin, também Património Mundial:
O caminho para Yerevan seria longo e por estradas em mau estado. Paramos ainda para tirar umas fotos ao Desfiladeiro do Rio Debed:
E a um pastor e seus animais:
Um campo de papoilas:
E seguimos para uma viagem de quase 4 horas até Yerevan. Pelo caminho passamos pelo Monte Aragats (4090m), o mais alto do território actual arménio, embora o símbolo do país seja o Monte Ararat (5137m), actualmente em território ocupado pela Turquia.