O tempo na Revolução de 5 de Outubro de 1910



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Cumulonimbus
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20 Nov 2006
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Moita, Setubal
Já agora deixar uma nota sobre um evento que se vai realizar na Moita.

"No dia 4 de Outubro, a partir das 21:30h, a Praça da República, na Moita, vai ser palco para uma reconstituição histórica do dia 4 de Outubro de 1910, na Moita, uma iniciativa integrada no âmbito das Comemorações do Centenário da Revolução Republicana no concelho, que evoca um facto importante, por vezes desconhecido, da história local, uma vez que o hastear da bandeira republicana no edifício municipal, na Moita, decorreu em antecipação à proclamação da República na capital, a 5 de Outubro de 1910."

Fonte C.M. Moita
 

martinus

Cumulus
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22 Dez 2006
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Portugal
Eheheheh tambem gostava mas é dificil de arranjar bibliografia sobre esse tema...

Para mim bastaram três minutos de pesquisa na internet. Mas eu sou velho nisto, claro.

"5 de Outubro de 1910

O quadro ingénuo que se perpetuou na memória do povo é fundamentalmente verdadeiro: um dia suavíssimo, com uma luz de apoteose, maltrapilhos de guarda aos bancos, desconhecidos a abraçarem-se, o Tejo como uma chapa ofuscante de aço na reverberação dum magnífico sol outonal"

Câmara Reys (1985). Raúl Proença. Edição da Biblioteca Nacional, p. 14.

-> Luís da Câmara Reys (1885-1965), fez parte do Grupo Seara Nova, defensor do Ideal Democrático, tinha 25 anos em 1910 e é muito natural que tivesse conservado a memória do dia.

-> O extracto foi retirado de uma versão digitalizada disponível no Google Books: http://books.google.com/
 

Minho

Cumulonimbus
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6 Set 2005
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Melgaço
A acreditar na veracidade das fontes, por observação indirecta podemos adivinhar pelas photographias da época que de facto estariam dias de sol por essa altura em Lisboa

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http://xafarica.weblog.com.pt/arquivo/140253.html
http://seculoxx.freewebpages.org/portugalxx.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Implantação_da_República_Portuguesa
 

Vince

Furacão
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23 Jan 2007
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O 5 de Outubro de 1910 foi certamente passado com temperaturas um pouco acima do normal para a época. Os dias que antecederam a "revolução" foram de alguma instabilidade moderada, primeiro com um cavado e frente fraca daquelas provavelmente quase em dissipação afectando apenas o noroeste do país, o suficiente para dizermos que o Verão já tinha acabado, depois esse cavado evoluiu para um retrogrado de NE para SW esse já mais instável, estrangulando-se posteriormente numa depressão isolada a SW, mas longe do continente. Em toda essa fase deve ter dado eventualmente algumas trovoadas pelo interior norte e centro, e terá ajudado à subida de uma dorsal africana moderada fazendo subir um pouco as temperaturas, situação que não durou muito tempo, ou seja, um padrão sinóptico já dinâmico que hoje consideraríamos mais usual de Setembro, mas de qualquer forma uma sinóptica que também não se poderia chamar de muito anormal sendo no início de Outubro, mesmo cem anos depois.

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Quanto à "revolução" e à Republica ou aos "vivas", apesar de republicano convicto, ainda não percebi muito bem o que andamos a festejar.

"A República foi feita pela chamada “geração de 90″ (1890), a chamada “geração doUltimatum“, educada pelo “caso Dreyfus” e, depois, pela radicalização da República Francesa de Waldeck-Rousseau, de Combes e do “Bloc des Gauches” (que, de resto, só acabou em 1909). Estes beneméritos (Afonso Costa, António José d”Almeida, França Borges e outros companheiros de caminho) escolheram deliberadamente a violência para liquidar a Monarquia. O Mundo, órgão oficioso do jacobinismo indígena, explicava: “Partidos como o republicano precisam de violência”, porque sem violência e “uma perseguição acintosa e clamorosa” não se cria “o ambiente indispensável à conquista do poder”. Na fase final (1903-1910), o republicanismo, no seu princípio e na sua natureza, não passou da violência, que a vitória do “5 de Outubro” generalizou a todo o país.

Não admira que a República nunca se tenha conseguido consolidar. De facto, nunca chegou a ser um regime. Era um “estado de coisas”, regularmente interrompido por golpes militares, insurreições de massa e uma verdadeira guerra civil. Em pouco mais de 15 anos morreu muita gente: em combate, executada na praça pública pelo “povo” em fúria ou assassinada por quadrilhas partidárias, como em 1921 o primeiro-ministro António Granjo, pela quadrilha do “Dente de Ouro”. O número de presos políticos, que raramente ficou por menos de um milhar, subiu em alguns momentos a mais de 3000. Como dizia Salazar, “simultânea ou sucessivamente” meio Portugal acabou por ir parar às democráticas cadeias da República, a maior parte das vezes sem saber porquê.

E , em 2010, a questão é esta: como é possível pedir aos partidos de uma democracia liberal que festejem uma ditadura terrorista em que reinavam “carbonários”, vigilantes de vário género e pêlo e a “formiga branca” do jacobinismo? Como é possível pedir a uma cultura política assente nos “direitos do homem e do cidadão” que preste homenagem oficial a uma cultura política que perseguia sem escrúpulos uma vasta e indeterminada multidão de “suspeitos” (anarquistas, anarco-sindicalistas, monárquicos, moderados e por aí fora)? Como é possível ao Estado da tolerância e da aceitação do “outro” mostrar agora o seu respeito por uma ideologia cuja essência era a erradicação do catolicismo? E, principalmente, como é possível ignorar que a Monarquia, apesar da sua decadência e da sua inoperância, fora um regime bem mais livre e legalista do que a grosseira cópia do pior radicalismo francês, que o “5 de Outubro” trouxe a Portugal?

(Adaptação do prefácio à 6.ª edição do meu livro O Poder e o Povo).

Público, 2 de Outubro de 2010
Vasco Pulido Valente
 

fog

Cirrus
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6 Abr 2008
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Olá; viva à República :1143:


Procuro algumas fontes (relatos, mapas, etc) que se refiram ao estado do tempo em Portugal Continental para o dia 5 de Outubro de 1910 …

Viva a República!


O dia 5 de Outubro de 1910 foi um dia de céu limpo ou pouco nublado, vento fraco, e em que se atingiu a temperatura máxima registada para o mês de 26,7ºC. Contudo, para o dia precedente, há registo de avistamento de relâmpagos, num mês marcado por elevada pluviosidade e trovoadas no decorrer da década final.

Algumas observações transcritas de publicações periódicas:

“(…)Lisboa, numa palavra, tem o aspecto dos seus dias habituais, a que não falta um sol claro e doce de Outono, que a ilumina da beleza e encanto(…)”.
In A Capital, nº 95, 1º ano, 4 de Outubro de 1910, p. 1


Nt. As sombras projectadas no solo das personagens fotografadas a 5 de Outubro de 1910 inclusas na Ilustração Portuguesa, em Lisboa, e também no mesmo número da revista a fotografia da Ericeira documentando o embarque da família real, onde se constatam as sombras na areia da praia e, no cimo do paredão fronteiro à praia, uma nuvem de sombrinhas abertas para proteger do sol a vasta multidão de curiosos.

V. Ilustração Portuguesa, nº 242 e 243, 10 e 17 de Outubro de 1910


“O quadro que hoje podemos apresentar a nossos leitores, mostra como se realizou, em a tarde de 5 do corrente, na praia da Ericeira, o embarque da família real para bordo do yacht Amélia, conduzida em barcos de pesca pertencentes ao sr. Catatau. O sol declinava já no horizonte e os seus últimos raios iluminavam em cheio a praia onde o mar, agitado pelo vento fresco, vinha quebrar-se contra os rochedos (…)”

In O Ocidente, nº 1146, 30 de Outubro de 1910, p. 246


“O Mês Meteorológico/ (…) Outubro 1910/ Barómetro – Max. Altura 768,9mm em 17/ Min. 753,6mm em 25/ Termómetro – Max. Altura 26,7 em 5/ Min. 11,5 em 14/ Chuva – 96,7 mm em 12 dias/ Grandes chuvas se manifestaram durante o mês, sendo as maiores alturas pluviométricas em 22 (15,2mm), 26 (14,4mm), 27 (19,4mm) e 29 (10,2mm)/ Nebulosidade – Céu limpo ou pouco nublado 7 dias/ Nublado 20 dias/ Encoberto 4 dias/ Vento dominante – SW/ Relâmpagos – em 4, 27 e 29/ Trovões – Em 29/ Trovoada – Em 28”.

In O Ocidente, nº 1148, 20 de Novembro de 1910, p. 264
 

fog

Cirrus
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6 Abr 2008
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A indicação meteorológica de O Ocidente, registando “relâmpagos” no dia 4 de Outubro de 1910, causou-me alguma estranheza. Compulsando as Memórias da Marquesa de Rio Maior, (Branca de Gonta Colaço, Memórias da Marquesa de Rio Maior, Lisboa, Parceria A. M. Pereira, 2005, p. 251), estando à data na sua residência do Largo da Anunciada, há a seguinte referência à madrugada de 4 de Outubro e que passo a transcrever: “ Seriam umas três horas da manhã, acordei com a sensação de que havia forte trovoada e me batia o granizo nas janelas. Não tardei a reconhecer que se tratava de detonações de artilharia. A casa tremia toda”. Não enjeito, portanto, a hipótese de o registo de “relâmpagos” se dever a uma confusão com o “troar” que então se verificava.
 

Vince

Furacão
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Interessantes contribuições que acabaram por aparecer neste tópico pessoal :thumbsup:


Aqui vão mais umas, a nível europeu nota-se uma grande ausência de dados de Portugal, curiosamente aparece a Horta nos Açores. Desconheço se foi da época, caótica, ou se não tínhamos mesmo nada de mais rotineiro e oficial.

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Zapião, são dados dos chamados modelos de reanálise. Quase tão importante como prever o tempo futuro, usa-se o conhecimento e tecnologia que temos hoje para simular o passado, usando todas as observações que havia disponíveis.
 

AnDré

Moderação
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22 Nov 2007
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Odivelas (140m) / Várzea da Serra (930m)
Entretanto o IM fez uma intervenção sobre este assunto:

A Meteorologia e a I República

De acordo com o Boletim Meteorológico, publicado no Diário do Governo n.º 7, de 13 de Outubro de 1910, no dia 5 de Outubro de 1910, às nove horas da manhã, o céu apresentava-se pouco nublado ou limpo no Continente, com excepção de Lisboa e Sintra, onde o céu esteve nublado. Não ocorreu precipitação e o vento soprava fraco a moderado do quadrante nordeste, exceptuando a costa sul onde o vento soprava do quadrante sueste. A temperatura do ar, observada em Lisboa, era de 18,2ºC.

No início da I República, embora o “Instituto do Infante D. Luís” centralizasse toda a informação meteorológica, proveniente dos observatórios e estações do território nacional e assegurasse a sua transmissão a nível internacional através de Paris, os diferentes observatórios e estações, resultado de interesse científico de personalidades locais, actuavam de forma não coordenada.

A importância dada à meteorologia pela I República, que se constata no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 7:275, de 28 de Janeiro de 1921, “sendo conveniente organizar os serviços meteorológicos, dada a sua incontestável importância, hoje reconhecida por todas as nações cultas”, criou condições para o desenvolvimento dos serviços meteorológicos quer na área e instrumentação quer na área do desenvolvimento científico.

Assim, em 1921, procedeu-se à primeira reorganização dos serviços meteorológicos, para os quais foram definidas competências nas áreas da climatologia, meteorologia dinâmica, incluindo a aviação, divulgação de conhecimentos meteorológicos e aferição de instrumentos, mantendo-se ainda como anexo aos serviços, o magnetismo, a sismologia e o estudo de todos os fenómenos referentes à física do globo. Foi ainda criado um Conselho Central de Meteorologia, com responsabilidade de coordenação dos serviços e de propor ao Governo uma nova organização para os serviços meteorológicos e para as actividades que lhes estavam anexadas.

Sob proposta de uma comissão técnica foram, em 1923, distribuídas as competências dos serviços meteorológicos pelas diversas instituições que deles faziam parte. Estas instituições e as competências que lhe estavam atribuídas vieram posteriormente a ser unificadas e centralizadas, em 1946, num único organismo, o Serviço Meteorológico Nacional.

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Mais em:
-> IM
-> Boletim Meteorológico (pdf)
-> A Meteorologia e a I República