Provavelmente esta será a espécie arbórea da flora portuguesa que menos portugueses conhecerão. E isto porque só agora se começa a saber sobre este carvalho, que na realidade é um híbrido (Quercus faginea x Quercus canariensis)!
E para simplificar as coisas, tomo a liberdade de lhe dar um nome comum. Por informação que colhi na sua área de ocorrência natural a população conhece esta belíssima árvore simplesmente como carvalho. Para distingui-la dos seus companheiros do género Quercus, passaremos a conhecê-lo como carvalho-do-sudoeste.
O carvalho-do-sudoeste foi a espécie que dominou os bosques em boa parte das serranias do sudoeste alentejano e do barlavento algarvio. Também ocorria em áreas mais húmidas e sombria das serras do sotavento algarvio, mais concretamente nos concelhos de Loulé, São Brás de Alportel e Tavira. Do outro lado do Guadiana, a espécie ocorre na serra de Aracena, sendo o seu limite oriental o rio Guadalquivir.
No passado a pastorícia foi uma importante actividade no Sul do país. O fogo era considerado um aliado pelos pastores, e as árvores um empecilho para a actividade. Os pastores acreditavam que depois dos incêndios, o pasto crescia com mais vigor. Ao longo dos séculos a pastorícia destruiu a vegetação arbórea das serras algarvias, expondo assim os solos inclinados à erosão provocada pelas chuvas torrenciais de Inverno. Assim ocorreu o assoreamento da foz do Guadiana e de outros rios e ribeiras como o Gilão ou o Arade.
Se não bastassem os incêndios, havia o problema da exploração madeireira. A produção de carvão foi no passado uma importante actividade económica no Sul. E havia ainda fornos de cal e de pão para aquecer... Para além disso a construção naval consumia enormes quantidades de madeira. Dada a importância económica da cortiça e a utilização da bolota de azinheira para alimentação dos porcos, os habitantes das aldeias do Sul cortavam os carvalhos e as árvores das galerias ripícolas, mas normalmente salvavam os sobreiros e as azinheiras. Para além disso, estas duas espécies foram amplamente cultivadas. O próprio sobreiro viu a sua área de distribuição natural aumentada, por acção antropogénica, acabando por ocupar o habitat dos carvalhos e da azinheira em vastas áreas do Sul do país, especialmente nas serras. E agora temos o pinheiro e o eucalipto a ocupar o espaço do sobreiro. Todos estes factores reduziram drasticamente a área ocupada pelos carvalhos marcescentes a Sul do Tejo. Dada a reduzida área de distribuição do Quercus marianica, a situação torna-se ainda mais preocupante para esta espécie.
O Quercus marianica ocorre no sudoeste ibérico regiões com Inverno moderadas, Verões quentes mas com alguma moderação nas temperaturas máximas médias, precipitação média anual acima dos 600/700 mm, e solos pouco degradados. Os vales e as encostas serranas mais frescas do sudoeste alentejano, serras algarvias (com excepção do terço oriental) e a área mais ocidental da serra Morena são os locais com as condições edafo-climáticas ideias para a espécie.
Devido ao abandono da pastorícia e da cultura do trigo, os bosques de Quercus marianica estão a recuperar em alguns vales e encostas dos concelhos de Odemira, Monchique e Aljezur. Contudo a situação da espécie em Portugal é muito precária. Não existem medidas de protecção e normalmente os proprietários eliminam totalmente os jovens carvalhos quando procedem às «lavouras» e «limpezas do mato». A maioria dos indivíduos que ocorrem no nosso país são jovens e escasseiam os carvalhos de idade avançada, os quais, importa sublinhar, atingem proporções consideráveis. Este facto dá uma noção da redução drástica que a espécie sofreu ao longo do tempo, a qual terá seguramente provocado uma extinção local em algumas áreas do Sul do país. Contudo ao visitarmos os locais onde a regeneração tem lugar constata-se algo que alguma bibliografia refere: o sobreiro foi pouco comum em vastas áreas serranas do Sudoeste, a quais terão sido dominadas por bosques de Quercus marianica. Pude constatar isto ao percorrer o vale de uma ribeira algures no Parque Natural da Costa Vicentina e Sudoeste Alentejano. Ao longo de vários quilómetros o carvalho-do-sudoeste está a ocupar as encostas serranas voltadas a Norte. E perto da ribeira há Quercus robur estremadurensis. E sobre o carvalho-roble, uma nota: a sub-espécie que ocorre no Sul é muito primitiva, uma relíquia botânica rara desconhecida e quase extinta em Portugal. E surge associado ao Quercus marianica.
Então e onde pára o Quercus canariensis? É provável que nunca tenha sido muito comum em Portugal. E também é possível que já se encontre extinto na serra de Monchique. Neste momento a espécie ocorre nas serras das províncias de Cádis, Málaga ou Almeria. Assim temos o Quercus marianica a ocidente do Guadalquivir e o Quercus canariensis a oriente.
Lamentavelmente, o Quercus marianica é desconhecido dos portugueses, o que revela o nosso grande atraso científico. Dada a sua raridade e importância ecológica, social e económica, seria importante que a espécie tivesse um estatuto de protecção especial, tal como já sucede com o sobreiro e a azinheira. Ou seja, o corte deveria ser proibido.
Ameaças:
- incêndios;
- ocupação do habitat com plantações de eucalipto, pinheiro-bravo, pinheiro-manso ou sobreiro;
- limpezas de mato e lavouras;
- agricultura intensiva;
- corte para venda da madeira;
- ocupação do habitat por invasoras;
- pisoteio;
- crescimento urbanístico e povoamento disperso.
Nota: quem quiser observar a espécie pode enviar-me MP. Só direi a localização dos bosquetes a utilizadores registados há mais de um ano no fórum e reservo-me ao direito de não responder a MPs.
Passei o fim-de-semana no PNCVSA a ver bosquetes deste carvalho, de carvalho-cerquinho e de amieiro.
E para simplificar as coisas, tomo a liberdade de lhe dar um nome comum. Por informação que colhi na sua área de ocorrência natural a população conhece esta belíssima árvore simplesmente como carvalho. Para distingui-la dos seus companheiros do género Quercus, passaremos a conhecê-lo como carvalho-do-sudoeste.
O carvalho-do-sudoeste foi a espécie que dominou os bosques em boa parte das serranias do sudoeste alentejano e do barlavento algarvio. Também ocorria em áreas mais húmidas e sombria das serras do sotavento algarvio, mais concretamente nos concelhos de Loulé, São Brás de Alportel e Tavira. Do outro lado do Guadiana, a espécie ocorre na serra de Aracena, sendo o seu limite oriental o rio Guadalquivir.
No passado a pastorícia foi uma importante actividade no Sul do país. O fogo era considerado um aliado pelos pastores, e as árvores um empecilho para a actividade. Os pastores acreditavam que depois dos incêndios, o pasto crescia com mais vigor. Ao longo dos séculos a pastorícia destruiu a vegetação arbórea das serras algarvias, expondo assim os solos inclinados à erosão provocada pelas chuvas torrenciais de Inverno. Assim ocorreu o assoreamento da foz do Guadiana e de outros rios e ribeiras como o Gilão ou o Arade.
Se não bastassem os incêndios, havia o problema da exploração madeireira. A produção de carvão foi no passado uma importante actividade económica no Sul. E havia ainda fornos de cal e de pão para aquecer... Para além disso a construção naval consumia enormes quantidades de madeira. Dada a importância económica da cortiça e a utilização da bolota de azinheira para alimentação dos porcos, os habitantes das aldeias do Sul cortavam os carvalhos e as árvores das galerias ripícolas, mas normalmente salvavam os sobreiros e as azinheiras. Para além disso, estas duas espécies foram amplamente cultivadas. O próprio sobreiro viu a sua área de distribuição natural aumentada, por acção antropogénica, acabando por ocupar o habitat dos carvalhos e da azinheira em vastas áreas do Sul do país, especialmente nas serras. E agora temos o pinheiro e o eucalipto a ocupar o espaço do sobreiro. Todos estes factores reduziram drasticamente a área ocupada pelos carvalhos marcescentes a Sul do Tejo. Dada a reduzida área de distribuição do Quercus marianica, a situação torna-se ainda mais preocupante para esta espécie.
O Quercus marianica ocorre no sudoeste ibérico regiões com Inverno moderadas, Verões quentes mas com alguma moderação nas temperaturas máximas médias, precipitação média anual acima dos 600/700 mm, e solos pouco degradados. Os vales e as encostas serranas mais frescas do sudoeste alentejano, serras algarvias (com excepção do terço oriental) e a área mais ocidental da serra Morena são os locais com as condições edafo-climáticas ideias para a espécie.
Devido ao abandono da pastorícia e da cultura do trigo, os bosques de Quercus marianica estão a recuperar em alguns vales e encostas dos concelhos de Odemira, Monchique e Aljezur. Contudo a situação da espécie em Portugal é muito precária. Não existem medidas de protecção e normalmente os proprietários eliminam totalmente os jovens carvalhos quando procedem às «lavouras» e «limpezas do mato». A maioria dos indivíduos que ocorrem no nosso país são jovens e escasseiam os carvalhos de idade avançada, os quais, importa sublinhar, atingem proporções consideráveis. Este facto dá uma noção da redução drástica que a espécie sofreu ao longo do tempo, a qual terá seguramente provocado uma extinção local em algumas áreas do Sul do país. Contudo ao visitarmos os locais onde a regeneração tem lugar constata-se algo que alguma bibliografia refere: o sobreiro foi pouco comum em vastas áreas serranas do Sudoeste, a quais terão sido dominadas por bosques de Quercus marianica. Pude constatar isto ao percorrer o vale de uma ribeira algures no Parque Natural da Costa Vicentina e Sudoeste Alentejano. Ao longo de vários quilómetros o carvalho-do-sudoeste está a ocupar as encostas serranas voltadas a Norte. E perto da ribeira há Quercus robur estremadurensis. E sobre o carvalho-roble, uma nota: a sub-espécie que ocorre no Sul é muito primitiva, uma relíquia botânica rara desconhecida e quase extinta em Portugal. E surge associado ao Quercus marianica.
Então e onde pára o Quercus canariensis? É provável que nunca tenha sido muito comum em Portugal. E também é possível que já se encontre extinto na serra de Monchique. Neste momento a espécie ocorre nas serras das províncias de Cádis, Málaga ou Almeria. Assim temos o Quercus marianica a ocidente do Guadalquivir e o Quercus canariensis a oriente.
Lamentavelmente, o Quercus marianica é desconhecido dos portugueses, o que revela o nosso grande atraso científico. Dada a sua raridade e importância ecológica, social e económica, seria importante que a espécie tivesse um estatuto de protecção especial, tal como já sucede com o sobreiro e a azinheira. Ou seja, o corte deveria ser proibido.
Ameaças:
- incêndios;
- ocupação do habitat com plantações de eucalipto, pinheiro-bravo, pinheiro-manso ou sobreiro;
- limpezas de mato e lavouras;
- agricultura intensiva;
- corte para venda da madeira;
- ocupação do habitat por invasoras;
- pisoteio;
- crescimento urbanístico e povoamento disperso.
Nota: quem quiser observar a espécie pode enviar-me MP. Só direi a localização dos bosquetes a utilizadores registados há mais de um ano no fórum e reservo-me ao direito de não responder a MPs.
Passei o fim-de-semana no PNCVSA a ver bosquetes deste carvalho, de carvalho-cerquinho e de amieiro.