O lixo oceânico dá à costa. Outrora julgadas limpas por não terem frequência significativa de visitantes, as praias selvagens do nosso litoral estão condenadas a serem uma lixeira. Não pelo lixo levado pelos visitantes e pescadores, que prolifera também como resultado de um incompreensível desprezo pelo que não é apenas deles mas de todos, humanos ou não, mas pelo lixo que cada vez mais está a ser devolvido pelo oceano. Já não há onda que não transporte lixo, água que por mais límpida que de longe pareça que não esteja infiltrada de todo o tipo de partículas e objectos artificiais, partículas tão pequenas que são ingeridas por todos os seres vivos; partículas microscópicas que provêm da lavagem das nossas roupas de fibras sintéticas e que não se decompôem quimicamente mas fracturam-se em pedaços cada vez mais pequenos até serem assimilados por simples células e organismos unicelulares, destruindo-as e contaminando quase invisivelmente toda a cadeia alimentar e ecossistemas.
Mas e que dizer do lixo graúdo? É que se ainda é possível pela boa vontade de alguns recolher uma grande parte dos objectos plásticos que pululam nas praias "selvagens", há lixo que talvez ninguém consiga tirar jamais por falta de recursos e de vontade oficial.
Ficam aqui algumas imagens.
Praia da Ursa:
O início de 2014 marcou uma afluência incrível de detritos e desde aí só tem aumentado. Sempre que visito a Ursa recolho alguns objectos e trago-os pelo trilho da falésia acima. Outros reuniram-nos em montes e lançaram-lhes fogo... plásticos de todo o tipo a serem incinerados a céu aberto numa reserva natural, não é solução.
Alvidrar, Praia do Caneiro (que ironia...):
Esta praia é talvez a última enseada selvagem quase sem visitantes. Para descer ao areal é necessário fazer escalada usando cordas. Já a visitei algumas vezes, um pequeno paraíso remoto, com um comjunto de cavernas e grutas oceânicas notáveis.
Em 10 de Abril de 2014, primeira vez que passei pelas falésias circundantes após os temporais de ondas do início desse ano, deparei com isto.
Isto são tubagens gigantescas usadas nos emissores submarinos de esgotos. Assim de longe parecem ter um diâmetro de quase dois metros (ainda não desci lá abaixo e medi) e várias dezenas de metros de comprimento embora pareçam ter sido quebradas em pedaços e provavelmente pertenciam a troços mais longos. De onde é que isto veio e como é que conseguiram entrar pela estreita enseada? Por que só apareceram aqui? Tentei investigar e a única coisa que encontrei que parece estar relacionada é esta notícia:
http://noticias.uol.com.br/lusa/ultnot/2002/02/28/ult611u9331.jhtm
Poderão ser os restos do megatubo de 518m de comprimento perdido no litoral norte do Rio de Janeiro há 12 anos? Custa-me a crer que as correntes os tenham transportado desde o Atlântico Sul. teriam que ter dado a volta toda, ser apanhados pela corrente de Benguela, cruzar o equador e captados nas Caraíbas pela corrente do Golfo. Penso que haverá uma origem muito mais próxima e serve a notícia para sabermos que este tipo de tubagens costuma ser rebocadas desde os locais de fabricação até aos destinos de instalação e que provavelmente estas também terão sido perdidas. A questão é: como é que vão ser retiradas dali?
Imagem de 17 de Abril, só para mostrar a dimensão em comparação com a figura diminuta de um pescador na falésia:
Coloquei esta mensagem no seguimento 2015 porque qual não foi o meu espanto e desgosto, quando fui há dois dias ver o pôr-do-sol ao Cabo da Roca, e captei esta imagem da Praia da Ursa:
Até a paisagem da Praia da Ursa já está condenada a incluír o nosso lixo.