Apagão Ibérico 28 Abril 2025

Outro assunto que tenho visto muito debatido nas redes sociais é a malta que tem painéis solares que ficaram sem luz na mesma. Como é óbvio, o autoconsumo está ligado à rede eléctrica aonde muitos têm contratos para venderem o excedente à rede, como é óbvio que esses ficaram privados de energia porque têm ligação à rede e isso afectou-os também, só um sistema off-grid com inversor off-grid e baterias é que estão isolados da rede e aí não sofrem nenhum efeito. Porque, a maioria pensa por ter painéis têm energia mesmo com falhas e isso não acontece, só os sistemas isolados ficam livres de cortes.
Eu tenho um projecto pessoal de ter paineis e um moinho eólico em autoconsumo mas as baterias são caríssimas! A ver se com a evolução tecnológica e massificação o valor baixa. De qualquer das formas estou a ver se implemento um sistema pequeno que aguente uma bomba para rega, um frigorífico, luzes, TV, ...pelo menos um ciclo diário. Para terrenos e moradias é mais fácil, para apartamentos a coisa complica-se...
 
Bem, se em Portugal surgiram criticas por só haver duas com essa função de black start, imagina então a dimensão de Espanha também só com duas.
Já agora, alguém sabe porque cá não pode haver mais visto que temos tantas barragens ? Implicará uma reserva mínima para esse efeito ou algo assim ?
A resposta para o não haver mais é simples, é muito caro e nós somos um país poupadinho, como sabes. Mas fizeste a pergunta duma maneira mais pertinente, que foi envolver as barragens, que no que toca a black starts são as centrais mais fáceis e mais baratas de meter online visto que, desde que haja água, algum controlo manual, e reservas de energia suficientes para abrir as condutas e excitar os geradores, rapidamente atingem um estado de produção autossustentável, servindo depois para o black start de outras centrais. Quem pensa nestas soluções, (espero eu) considera sempre o pior cenário possível, e o pior cenário possível é quereres fazer um black start com uma central hidroelétrica e não haver água. Portanto, o problema, num país com pouca oportunidade de escolha sobre onde se pode ou não gastar dinheiro, penso, ter-se-à prendido mais pela incerteza do haver ou não água suficiente sempre e a qualqer momento. Água haverá sempre alguma, mas se houver pouca e depois não chegar para meter a próxima central a funcionar?

O que se arranja com mais facilidade são os tradicionais combustíveis (carvão, gás, petróleo, etc), portanto, por mais que não se goste de usar isso para produção "normal", e não é obrigatório que uma central equipada com os sistemas necessários para fazer um black start seja uma que está sempre em funcionamento, ter centrais preparadas para um black start que dependem duma coisa 100% garantida, mesmo que tenha de ser ir buscar a outro lado, quando não podemos ter tudo com capacidade de black start (ninguém tem, seria absurdo), é a escolha acertada. Agora, na minha humilde opinião, TODAS as centrais hidroelétricas, deviam estar equipadas de modo a poderem fazer black start, mesmo correndo o risco de quando serem precisas não conseguirem restablecer a rede só porque é tão mais barato comparativamente às restantes e não faz sentido não ter essa opção.

Para alguém que esteja mais curioso em relação ao facto de não ser possível fazer um black start em qualquer lado, para terem uma ideia, em média, uma central de produção elétrica precisa de entre 5 a 10% (varia um bocado com o tipo de central e a idade, daí a discrepância tão grande) da sua capacidade de produção máxima só para poder arrancar e começar a produzir energia. Quando falamos de centrais que produzem na ordem dos GW ou perto disso (a nossa maior como já referido aqui por outro membro produz 1.2GW - precisaria de entre 60 a 120MW e, números redondos, para por isto em perspectiva, 120MW chega para alimentar ~120.000 casas), muito rapidamente se percebe a absurdidade da ideia, quer pelos custos associados quer pela dimensão que o sistema de black start (que está lá montado mas o objectivo é nunca ser preciso) tem que ter. Há maneiras de diminuir esses requisitos, obviamente, especialmente em centrais segmentadas (que tenham vários geradores completamente independentes) e assim reduz-se o dimensionamento do equipamento de black start para ter capacidade de arrancar só com uma parte da central, que por sua vez arranca com o resto, e depois está pronta para começar a ligar centrais sem essa capacidade, como é o caso da Tapada do Outeiro, que tem 3 grupos de 330MW cada, presumo que o black start aí se faz só com um grupo, precisando "só" de cerca de 5 a 10MW.
 
Última edição:
Muito obrigado TxMxR

Mas temo que não entendido inteiramente algumas das coisas que referes
Eu tenho uma vaga memória de há muitos anos (numa visita de estudo na juventude) que as barragens eram boas para blackstart porque não era significativa a energia necessária para pôr tudo em marcha.

Quando referes 5-10% da capacidade máxima, isso significa capacidade que depois não se pode usar na operação normal do dia a dia ?
Tipo, a ideia que tinha era que tinha que ser uma parte separada também da rede "normal" por razões já apontadas aqui, mas isso significa que se teria que sacrificar esses 5-10% sempre, só para essa função ?

Entretanto soube-se ontem que Castelo de Bode arrancou com um gerador que teve que vir de fora, ou seja, na prática também não funcionou como uma blackstart operacional, ou vá, não estava a 100% operacional, certo ? Apesar de ser remunerada para tal.

Sobre custos, não me parecem significativos em termos anuais. Ironicamente a REN já tinha estudos em marcha para novas blackstart mas a ideia era para substituir as atuais por outras mais modernas. Agora terá que se pensar melhor nisto tudo.
 
Última edição:
Tenho aprendido imenso com os vossos contributos.:)
Este apagão veio demonstrar fragilidades da rede eléctrica. Agora vou fazer uma pergunta de leigo, e por muito ridícula que possa parecer tentem me responder.
O hidrogénio verde, poderia ser uma solução? O hidrogénio é um combustível, poderão haver centrais que funcionem só com esses combustível? E se sim, isso poderá levar a uma maior independência energética e ajudar nesses apagões?
 
Eu tenho uma vaga memória de há muitos anos (numa visita de estudo na juventude) que as barragens eram boas para blackstart porque não era significativa a energia necessária para pôr tudo em marcha.
E tens razão, como referi bastam umas reservas para abrir condutas e excitar o(s) gerador(es), daí eu ser da opinião de que mesmo havendo a possibilidade de não se conseguir repor a rede a partir duma dessas centrais 100% das vezes, o equipamento devia estar lá. Mas também facilmente se leva para lá esse equipamento se for mesmo preciso, como se fez em Castelo de Bode como referiste.

Quando referes 5-10% da capacidade máxima, isso significa capacidade que depois não se pode usar na operação normal do dia a dia ?
Tipo, a ideia que tinha era que tinha que ser uma parte separada também da rede "normal" por razões já apontadas aqui, mas isso significa que se teria que sacrificar esses 5-10% sempre, só para essa função ?
Aqui não percebo bem se falas da capacidade do sistema de black start ou se só dessa parte da energia que a central precisa.

O sistema de black start não produz energia em circunstâncias normais, é um sistema de emergência, por norma ineficiente (quando comparado com uma central), que serve só mesmo para aquilo. Uma maneira muito simples de ter uma ideia da função do sistema black start é imaginar o seguinte: tens 2 ou 3 camiões que precisam de estar a trabalhar 24/7, que têm alternador, mas não têm bateria, então tens ali parados 2 ou 3 carros a gasolina, e esses já têm bateria e pegam sozinhos, e quando os camiões vão todos abaixo ao mesmo tempo por algum motivo, metes os carros a gasolina a trabalhar, "ligas os cabos" dos carros a um camião, e é assim que o metes a trabalhar outra vez, e depois com esse arrancas mais um, e esses dois arrancam o último, depois voltas a desligar os carros a gasolina (e fazes manutenção preventiva neles durante 20/30/40 anos até precisares deles outra vez).

Se te estás a referir a essa percentagem de energia que a central precisa, ela é usada sim, mas gerada pela central e para consumo próprio da central.
Isto porquê, uma central elétrica antes de conseguir produzir energia tem de ter energia para excitar o gerador (já explico o porquê disto), e tem de ter energia para todos os outros processos que têm de existir (variam muito de central para central, mas por norma há sempre bombas, que são elétricas, ventilação, computadores, etc. Tudo junto aquilo é uma fábrica de escala relativamente grande que tem de estar a funcionar antes de conseguires gerar energia).

No que toca a excitar geradores, sem entrar em imensos detalhes desinteressantes, vou só dar um toque em noções de física que podem já estar esquecidas pela maioria. Primeiro, é impossível criar energia, a energia tem que ser transformada no tipo de energia que se precisa, neste caso específico, para se transformar a energia a que temos acesso, em energia elétrica, há variás coisas que têm de ser feitas.
O princípio básico dum gerador em si, é uma coisa que quase de certeza todos aqui conhecemos nem que seja por alto, o típico dínamo das antigas bicicletas, que consiste dum íman que rodeia um veio central (o rotor - que nós fazemos rodar com um determinado tipo de trabalho[força]) rodeado duma malha de cabos de cobre (o estator, o íman, que através da interação com o rotor tenta impedir a sua rotação). Portanto, nisto, o trabalho exercido sobre o rotor, por causa da resistência imposta pelo estator (que só existe depois de ser excitado), faz com que (em termos simples) seja gerado calor e energia elétrica (que gera um campo magnético). Numa bicicleta normalmente temos duas hipóteses, ou é a energia do bife do almoço, ou a força da gravidade numa descida que sofre essa transformação (com algumas perdas pelo caminho)

Um gerador funciona com o mesmo princípio básico, a resistência à rotação é o trabalho usado para obter energia elétrica, mas o "íman" não é, nem pode ser, auto-excitado, ao contrário do dínamo (não usei o alternador como exemplo porque esse também não pode ser auto-excitado, e os dínamos produzem corrente DC, os alternadores AC, os geradores tanto pode ser AC como DC, mas isso pouco interessa para perceber este ponto). Portanto, para além da energia cinética necessária para fazer rodar o rotor (água ou vapor por norma), temos de ter também energia, já elétrica neste caso, para a excitação dos campos magnéticos, para que haja total e absoluto controlo da energia que está a ser gerada a qualquer momento e de que maneira, bem como da velocidade de rotação (depois aqui entram as frequências e a sincronização de que tanto se falou no dia 28 que tem de existir entre as diferentes fontes de energia para não desabar tudo - desabar, com os sistemas de segurança que temos, entenda-se: apagão; sem os sistemas de segurança... calamidade total.. centrais destruídas, linhas a arder, tudo o que possam imaginar).

Sobre custos, não me parecem significativos em termos anuais. Ironicamente a REN já tinha estudos em marcha para novas blackstart mas a ideia era para substituir as atuais por outras mais modernas. Agora terá que se pensar melhor nisto tudo.
De facto, à escala de um país, parecem não ser, e atenção que concordo contigo mas há que fazer o papel do advogado do Diabo, mas voltando ao exemplo dos carros a gasolina, estamos a comprar e manter um sistema, a contratar pessoas, e a gastar recursos numa coisa que muito raramente (felizmente) vai ser utilizada. São os tais 20 e poucos milhões por ano (para já) mais o outro tanto que se gasta na implementação, que ao fim de uns anos são centenas ou milhares de milhões numa coisa que nunca usaste. Aqui tem que se fazer uma análise das necessidades, quantas centrais precisamos com esta capacidade, quanto tempo queremos demorar a repor a rede depois duma falha total, etc.
E acho que, especialmente tendo em conta que houve falhas em CdB, e certamente estavam todos às aranhas a tentar perceber (inicialmente) se sequer se podia reiniciar a rede ou não (sem saber a causa dum apagão pode ser perigoso tentar ligar coisas), perdemos 9 a 12 horas para resolver o problema, e eu, que sou muito crítico do nosso país até fiquei surpreendido pela positiva. Era melhor se tivesse demorado uma hora ou duas, era melhor se tivéssemos mais duas ou três centrais para black start, era melhor se CdB estivesse operacional como imperativamente teria absolutamente que estar, mas não estamos assim tão mal, a meu ver.
 
O hidrogénio verde, poderia ser uma solução? O hidrogénio é um combustível, poderão haver centrais que funcionem só com esses combustível? E se sim, isso poderá levar a uma maior independência energética e ajudar nesses apagões?
O hidrogénio (verde ou não) tem um problema. É preciso electricidade para o obter. Portanto se estarias a pensar para uma situação de black start, não seria o ideal, até porque o hidrogénio é famosamente complicado de armazenar.

O hidrogénio verde chama-se assim porque depende de energias "verdes" para ser obtido, mas isso presumo que já saberias. Isto traz outras nuances, e, segundo consta, essas energias verdes podem até ter estado na origem do apagão. Só se vai saber quando lançarem o report, obviamente, mas consta que foi por causa duma central de painéis solares que isto aconteceu. Os painéis solares em si, ou a energia eólica, não são o problema, o problema é que são fontes de energia inconstantes, e instabilidades na rede (que não tenham resposta imediata) causam apagões, que podem ou não ser generalizados (vai depender da dimensão do esticão e quantas centrais manda abaixo inicialmente, depois chega a um ponto em que é tipo dominó e é virtualmente impossível que não caia a rede toda).

No que toca a independência energética parece que, de facto, a temos, visto que conseguimos repor a rede (mais pequena, claro) antes de Espanha, sem ajuda deles, e ficámos um bom bocado sem nos ligar a eles (nem sei se já terá havido essa ligação ou não mas presumo que sim porque penso que ontem já aparecia alguma energia importada). Como foi referido estes dias pelo pessoal responsável, nós temos independência energética, não temos é independência económica, portanto toca a comprar energia de Espanha que é mais barata (mas não emprega portugueses, nem nos permite depois ter excedente para sermos nós a ter a energia barata e vender mais vezes, nem baixar o preço ao consumidor).
 
(...)

Para alguém que esteja mais curioso em relação ao facto de não ser possível fazer um black start em qualquer lado, para terem uma ideia, em média, uma central de produção elétrica precisa de entre 5 a 10% (varia um bocado com o tipo de central e a idade, daí a discrepância tão grande) da sua capacidade de produção máxima só para poder arrancar e começar a produzir energia. Quando falamos de centrais que produzem na ordem dos GW ou perto disso (a nossa maior como já referido aqui por outro membro produz 1.2GW - precisaria de entre 60 a 120MW e, números redondos, para por isto em perspectiva, 120MW chega para alimentar ~120.000 casas), muito rapidamente se percebe a absurdidade da ideia, quer pelos custos associados quer pela dimensão que o sistema de black start (que está lá montado mas o objectivo é nunca ser preciso) tem que ter. Há maneiras de diminuir esses requisitos, obviamente, especialmente em centrais segmentadas (que tenham vários geradores completamente independentes) e assim reduz-se o dimensionamento do equipamento de black start para ter capacidade de arrancar só com uma parte da central, que por sua vez arranca com o resto, e depois está pronta para começar a ligar centrais sem essa capacidade, como é o caso da Tapada do Outeiro, que tem 3 grupos de 330MW cada, presumo que o black start aí se faz só com um grupo, precisando "só" de cerca de 5 a 10MW.

Estou longe de ter conhecimento profundo sobre a temática. Mas, a maior central do País tem 1200MW, central de ciclo combinado do Ribatejo, está dividida em 3 grupos, portanto tal como a da Tapada do Outeiro o black start, a existir, estaria associado a apenas um grupo.

Bem, parece que este apagão serviu de alerta para a necessidade de haver mais centrais com este sistema de arranque autónomo. Felizmente já se fala em equipar pelo menos mais duas centrais hidroelétricas com esta capacidade.
 
Última edição:
Estou longe de ter conhecimento profundo sobre a temática.
Tu e eu, tenho é algum background "primo" disto portanto aquilo que sei com o que vou ouvindo/lendo dá para preencher algumas lacunas e saciar uma curiosidade ou outra a quem as possa ter. :hehe:

Mas, a maior central do País tem 1200MW, central de ciclo combinado do Ribatejo, está dividida em 3 grupos, portanto tal como a da Tapada do Outeiro o black start, a existir, estaria associado a apenas um grupo.
Presumi que assim fosse também, mas não fui verificar, serviu só como exemplo daquilo que seria um "máximo" e o porquê de não ser viável em qualquer lado, mas lá está, sendo grupos independentes só um é que precisa de arrancar em black por completo, os restantes não. Resta no entanto saber a maneira como a fábrica em si está repartida, isto porque se for necessário ligar a maioria dela, mesmo para iniciar só um gerador, a energia necessária para o arranque seja para um ou para três, acaba por ser semelhante, se for total e completamente modular é que já é preciso muito menos. Já trabalhei em locais com geradores já dignos desse nome (muito semelhantes aos usados para black starts até), para produção própria (com biogás neste caso) e num caso específico, antes de se conseguir ligar um gerador (eram três) era preciso ligar o sistema todo. Neste caso, sendo para ligar um ou os três, ia-se precisar da mesma energia mais coisa menos coisa, mas quero acreditar que, apesar do local a que me refiro aqui ser "do estado", numa central da qual um país (ou parte dele) depende, as coisas são feitas de maneira mais lógica.

Bem, parece que este apagão serviu de alerta para a necessidade de haver mais centrais com este sistema de arranque autónomo. Felizmente já se fala em equipar pelo menos mais duas centrais hidroelétricas com esta capacidade.
E não só. Acho que muita gente que tenha essa possibilidade, especialmente quem já tem painéis, vai pensar em gastar uns trocos e implementar um sistema off-grid, melhor que ter um país com uma rede elétrica fiável e dependente (que até ver, temos) só ter um país em que uma grande parte dos cidadãos não depende unicamente dessa rede.