Muita calma com essa conversa do rompimento do vórtice polar, e da cota 0. Isso é uma extrapolação completamente irreal. O que acontece é que quando há um aquecimento súbito na estratosfera, o Vórtice Polar pode-se partir em dois, ou pode ser bastante deslocado da sua posição. Já aí são duas coisas distintas.. Além do "pode", pois o sinal do aquecimento na estratosfera demora semanas a propagar até cá abaixo, e nem sempre resulta nesse cenário mais alterado da circulação polar na baixa atmosfera, portanto, o primeiro SE...
Segundo, o resultado da separação do vórtice em dois é diferente do deslocar do centro do vórtice. O primeiro garante muito mais "agitação' dos padrões zonais normais por todo o hemisfério do que o segundo. No caso do segundo depende da "lotaria" de para onde é empurrado o vórtice. Se em zonas como a América do Norte esse deslocamento é geralmente sinónimo de frio polar, aqui pode não ser nada disso. Geralmente para uma zona como a nossa com todo o Atlântico a oeste, deslocamentos do Vórtice Polar não resultam em nada excepcional. Volto a referir que em ambos os casos, os locais onde haverá mais animação serão sempre resultantes da lotaria de como e onde é afectado o Vórtice. Portanto, mais um SE... Sendo que no caso da quebra em dois sim a lotaria é mais abrangente. Mas aparentemente, a acontecer algo parece que irá ser do tipo deslocamento e não quebra...
Mais ainda, em qualquer dos cenários, além da lotaria, o que acontece é uma alteração de centros de acção, nomeadamente dos bloqueios e do jetstream. Portanto claro aumenta simultaneamente nuns locais a probabilidade de entradas frias, enquanto noutros pelo contrário causa o efeito oposto. Mais um SE dependendo de quando e onde...
Por fim, mesmo após estes SE's, se tivermos a sorte de o padrão mudar para um que favoreça bloqueio a norte e entradas frias decentes na nossa zona, estamos apenas a aumentar a chance de bons eventos. Não garante cota 0 em lado nenhum, isso é um dispararate. Não estamos no filme "O dia depois de amanhã" em que tudo congela. O potencial das entradas frias com ou sem aquecimento da estratosfera é o mesmo, ou seja, continuamos dependentes da "quantidade" de frio, de serem secas ou não, da posição das depressões, e sempre dependentes de estarmos no SW da Europa, bem suavizados pelo Atlântico.
Resumindo, estes episódios não são milagres, acontecem bastantes vezes e raramente resultam em alguma coisa de especial em Portugal. O mais que podemos dizer é que sempre baralham e lançam os dados na circulação atmosférica. Claro que no marasmo zonal em que estamos agora essa possibilidade é sempre animadora, e aumenta as chances de eventos épicos de quase nulas, para baixas... Podemos dizer que aumenta ligeiramente a probabilidade de ocorrência de milagres. Mas continuamos sempre a precisar desses milagres...
